O Brasil é o país número 1 no mundo em cirurgias plásticas e está no top 5 dos que mais consomem suplementos energéticos.
Nos últimos dez anos, a prática de futebol no país caiu quase 30% e a musculação aumentou quase 20% - talvez isso explique os 7 x 1 da Alemanha...
Estão trocando o elemento lúdico pelo sacrifício.
Treinar, dizem.
Treinar para nada.
Para exibir músculos e definir o corpo segundo os violentos padrões estéticos que vigoram.
A febre da academia (ou ginásio) agora também vai se espalhando por Portugal, muito provavelmente devido à influência brasileira.
Uma parte significativa dos portugueses que conheço passou a ter a musculação como hábito.
Quase todos os meus amigos de infância do Brasil tornaram-se corpulentos e musculosos. Eu não teria qualquer chance num confronto com eles.
E adoram exibir seus físicos que contrastam com o pequeno volume das suas cabeças, desproporcionais às magnitudes corporais alcançadas.
É uma postura sobretudo masculina, talvez incrementada no apelo das recentes modas desportivas violentas (MMA, UFC e até Futebol Americano), embora não seja exclusividade dos homens, claro.
É uma postura sobretudo masculina, talvez incrementada no apelo das recentes modas desportivas violentas (MMA, UFC e até Futebol Americano), embora não seja exclusividade dos homens, claro.
Nunca entrei numa academia de musculação.
Não pretendo um dia entrar.
Não celebro o meu sedentarismo, mas atividades físicas saudáveis são bem diferentes da busca pelo corpo socialmente padronizado.
Não tenho o mínimo interesse em músculos e não tenho vergonha nenhuma de exibir meu corpinho franzino com aquela barriga de cerveja saliente.
Foda-se!
De todas as inutilidades inventadas para desperdiçar o tempo das pessoas, a musculação luta para ser a mais grotesca.
É evidente que as pessoas que se sujeitam a ela querem ter desesperadamente o corpo que a indústria do consumo lhes impinge, embora jurem cinicamente - enganando a si próprias - que o intuito seja apenas praticar atividades físicas.
Balela!
Se realmente quisessem praticar atividades, escolheriam modalidades desportivas divertidas que unissem o esforço físico ao elemento lúdico.
Pegar peso num estabelecimento fechado cheio de máquinas não apenas soa a martírio, mas se configura como tal.
É absolutamente enfadonho.
Quem quer exercitar-se fisicamente tem todo um leque de opções coletivas ou individuais.
Há uma lista infindável, inclusive com modalidades de contato direto com a natureza.
Mas quem quer apenas criar músculos e exibir a aparência, enclausura-se em estabelecimentos de musculação.
Para...treinar.
Subverteram o significado do verbo.
Agora ele não significa preparação para algo.
Quando jogava futebol, eu treinava para uma partida, mesmo que fosse apenas contra outro time do bairro. O elemento competitivo aliava-se ao puro prazer.
Agora "treinar" significa o ato em si e não indica nenhum objetivo técnico.
Treina-se em nome de uma aparência.
De um padrão estético.
Treina-se para absolutamente nada!
"Ah, mas eu me sinto bem assim".
Não duvido!
A maioria das pessoas sente-se bem seguindo modas e costumes massificados.
Por isso mesmo é que são massificados.
E são inúteis em todos os sentidos, inclusive desportivamente.
O único sentido é mesmo conseguir alcançar e manter uma aparência estabelecida socialmente.
É a personificação da futilidade.
Quantas dessas pessoas seguiriam "treinando" caso não houvesse nenhum resultado físico visível?
É a pergunta incontornável que lanço.
Imaginem não terem "substância" para as selfies no Facebook.
Em vez do treinamento do corpo para eventos relevantes, ou da mente para o seu desenvolvimento intelectual pleno, perdem tempo com algo que não servirá para absolutamente nada quando os anos se mostrarem cada vez mais implacáveis.
E o fazem exatamente porque a musculação não exige esforço mental.
São sessões limitadas ao corpo nas quais a existência de neurônios é desnecessária.
Não insinuo que essas pessoas sejam burras. Nada disso.
Elas ESTÃO burras.
Limitam-se temporariamente.
Mas muitos acabam por criar estilo de vida.
Certamente há quem questione tal sujeição, embora a influência social seja mais forte que a afirmação individual.
Atenção que isto não é um manifesto em defesa do sedentarismo.
As atividades físicas devem ser, sim, encorajadas.
Mas atividades genuínas, que tenham sentido.
A obsessão pelo corpo padrão está mais para doença psicossociológica.
A quantidade de coisas que podem ser feitas no tempo desperdiçado com essas ilusões só reforça a gravidade do hábito.
Se, em vez de músculos, desenvolvessem aptidões intelectuais, artísticas, técnicas e mesmo desportivas, poderíamos ter uma geração física e mentalmente muito mais saudável.
Há cada vez mais corpos desenvolvidos e sarados.
O que me interessa é se há desenvolvimento e sanidade dentro deles.
Desenvolvimento está patente na plena capacidade intelectual. No discernimento, no pensamento complexo e coerente e na sua materialização verbal e escrita.
Sanidade está na afirmação de aspirações pessoais independentes de pressões e padrões estabelecidos.
É um mundo obcecado pela aparência que procura saúde física em enfermidades mentais.
A sua negação é um ato de rebeldia.
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